Era recorrente a minha fala na terapia de que "eu queria querer menos". Sempre falei isso com pesar, como se fosse ruim querer ser e fazer muitas coisas. Minha psicóloga sempre me perguntava qual era a quantidade ideal do querer, e eu nunca soube responder. A verdade é que me frustrava querer demais e, por isso, querer menos talvez fosse o melhor cenário. Mas que régua é essa que mede o que a gente pode querer?
Durante a minha vida, eu sempre quis ser um monte de coisas. Brinco dizendo que no odaverso minhas outras versões são tudo o que eu não pude ser nessa existência. Deve haver um Oda que realmente vive da sua arte. Outro que ficou em Araçatuba/SP e trabalha no mercadinho do pai dele. Há um Oda que decidiu trabalhar com música. Também deve haver um Oda que seguiu o sonho de criança de ser biólogo porque assistia o Sérgio Rangel no Programa da Eliana e ficava fascinado. Deve existir um que é professor, e outro que é apresentador de programa de TV. Quais outras coisas você já quis ser na vida?
Comecei recentemente um emprego novo. Não trabalhava com contrato CLT e presencial desde 2016. Na época que decidi ser freelancer, meu objetivo era ser dono do meu trabalho, e poder gerir meu tempo para me dedicar a projetos pessoais. Acho que sem esse momento de vida, minhas galinhas não teriam nascido. Mas, em dois meses trabalhando presencialmente, não pude tocar meus projetos como eu fazia antes. Essa publicação que você está lendo, por exemplo, está atrasada. Tudo tem sido legal porque estou num momento da vida que preciso de estabilidade (viver só de arte é difícil kk) e focar na minha carreira (muito complicado se desenvolver sendo autônomo e sem herança). Mas para cada escolha, há uma renúncia. Ou meu trabalho, ou minha arte, ou qualquer outra coisa que eu queira fazer. Afinal, o que eu crio para a publicidade está longe de ser o que eu gostaria de produzir como realização pessoal.
Desde que conheci o termo "bovarismo", me pergunto se tenho vivido isso. A expressão é derivada da personagem Emma Bovary, protagonista do romance Madame Bovary de Gustave Flaubert. E refere-se à tendência de uma pessoa idealizar a vida e buscar satisfação em fantasias inatingíveis, muitas vezes levando-a à insatisfação crônica e ao descontentamento com a realidade. E eu achando que eu só idealizava o amor romântico… Quando penso em todos os Odas do multiverso citados anteriormente, será que eles também não estariam se queixando de que eu, neste corpo e mente, não os deixo sair?
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Uma vez li que "viver sem expectativas é morrer aos pouquinhos" (esqueci de quem é a frase, me desculpe). Então, ao invés de querer menos, hoje busco lidar com o que me cabe, ser o que posso. Quero encontrar um equilíbrio entre o que eu sou, o que eu quero,e o que eu espero de mim e do mundo. Você também é daqueles que quer muito?
Lembrete: o que a gente conseguiu ser, é o melhor que a gente poderia querer.
Pra gente se inspirar
Quando escrevi a parte do multiverso desta publicação, lembrei do Seamus Wray, artista estadunidense que viralizou na pandemia ao pintar loopings de si mesmo se pintando. Acredito ser uma boa analogia sobre quantos eus cabem em nós mesmos e me lembra um pouco o clássico meme do encontro de homens-aranha. Também gosto de pensar que, essas obras dele nos dão um recado: no fim, a gente vai ser o que a gente é, várias vezes a mesma coisa, porque a gente quis assim. Você concorda? (Será que a gente tem de fato a escolha de ser diferente?)
Veja todas as artes dessa série de Seamus Wray.
Pra gente se conectar
O livro Madame Bovary, de Gustave Flaubert.
O filme Tudo Em Todo Lugar Ao Mesmo Tempo, traz um pouco dessa visão de querer ser outras coisas e como nossas escolhas impactam nossa vida.
Roberto Alarcon canta sobre manter a distância do amor, apesar de querer.
E não menos importante, Deborah Secco fala pro Bial que "a gente não é o que a gente quer ser".
Agradecimento especial ao Álefe Gonçalves, que revisou os textos desta publicação com muito carinho.
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tadinho do peixinho 😭